segunda-feira, 24 de maio de 2010

a inversão dos conceitos

quarta-feira passada, na faculdade, a professora apresentou o seguinte caso para a turma debater:

(resumo)
um homem, que trabalhava há 20 anos em uma empresa, vinha 'pegando' diariamente pães da cantina sem autorização e levando para comer fora do expediente por conta de uma gastrite. seus colegas sabiam. seu chefe também. já tinha sido alertado que não estava agindo certo. um belo dia, foi pego pelos seguranças da empresa e então foi demitido por justa causa. o sindicato e a imprensa caíram em cima da empresa, alegando que havia sido um erro demiti-lo. a empresa acabou readmitindo o tal funcionário.

resumidamente foi isso. teve uma pessoa na classe que disse que esse caso aconteceu de verdade em São Paulo. não sei, mas sei que houve um debate caloroso na sala de aula e eu, mais uma vez, fui a minoria. eu e o P.

foi assim:
a professora perguntou de cara:
quem acha que a empresa errou em demitir o funcionário?

todos (aproximadamente uns 15 alunos), exceto P e eu, levantaram as mãos.
então, a professora perguntou:
quem concorda com a demissão do funcionário?

P e eu levantamos as mãos.

silêncio seguido de espanto! e então começou o debate caloroso.

ela perguntou pra mim e para o P porque achávamos certo a demissão.
respondemos que o funcionário tinha cometido roubo e que se a empresa não tolera esse tipo de comportamento, tem que haver punição, seja roubo de pão ou de dinheiro.
imediatamente fomos abafados pelos comentários feitos ao mesmo tempo por colegas que se indignaram com nossa resposta.
a professora, imparcial, pediu silêncio e me deu a palavra.
eu então, fundamentei minha opinião:

gente, se ele foi pego pelo segurança da empresa com pães na bolsa e foi levado à direção da empresa, subentende-se que a prática de pegar pães além do que era servido na cantina não era autorizada. código de ética da empresa.
se ele pegava pães por conta de uma gastrite ou por outro motivo qualquer, pegava sem autorização. estava roubando.
a empresa o demitiu por não tolerar roubo, seja de pão ou de qualquer outra coisa.
roubo é roubo.
ele, tinha que ter parado com essa prática quando foi alertado pelo seu chefe.
quem é capaz de roubar um pão, é capaz de roubar dinheiro, material, etc...
eu o demitiria e acho que a empresa errou em tê-lo re-adimitido. ah, eu demitiria o chefe dele também, que permitia tal comportamento. foi conivente.

minhas palavras causaram espanto e comoção geral. pois se tratava de pão. como eu demitiria alguém que trabalhava há anos na empresa por conta de pães?
então, a aluna I, que até então eu nunca tinha ouvido a voz dela no semestre todo, se manifestou com a seguinte frase:

não concordo com a demissão. não era roubo. todo mundo sabia que ele pegava pão. todo mundo via. isso não era roubo!

HÃ? COMO ASSIM? SÓ PORQUE TODO MUNDO VIU, O ATO DE ROUBAR ESTAVA SENDO DESCARACTERIZADO?
É ISSO?

não me contive e perguntei:

você, eu e a nação brasileira sabemos que existem parlamentares roubando nosso dinheiro lá em Brasília. sabemos que existem pessoas nos governos estaduais e nas prefeituras desviando dinheiro público. os jornais denunciam isso diariamente. TODOS NÓS SABEMOS! o fato de sabermos desqualifica o roubo de nosso dinheiro? hã?

nem preciso dizer que ela não teve argumentos pra me responder, né?

e quando vi que não adiantaria me desgastar sustentando minha opinião, e que de nada serviria meus argumentos, pois a maioria dos alunos discordavam que o funcionário tinha roubado, me calei.

perceber que tudo está virado me fez muda.
eles não puderam (não sei o que impede universitários de instigar seu raciocínio) compreender que o fato de que eles entenderam a causa do roubo dos pães (gastrite) e de que perdoariam a atitude do funcionário, não desqualificaria o roubo.

roubo é roubo.
os motivos que levam alguém a roubar, não desqualifica um roubo.
o fato de haver perdão, não significa que não houve roubo.

GENTE!! O QUE ESTÁ ACONTECENDO COM O FUTURO DA NAÇÃO (NÓS, OS JOVENS)?

o que está acontecendo com a ética?
por que as pessoas estão corrompendo os princípios morais básicos da boa convivência em sociedade? onde iremos parar?
alunos de uma universidade privada, a maioria moradora da zona sul do Rio de Janeiro, com situação confortável de vida, com acesso à educação, empregados.....
são pessoas que não possuem necessidades básicas. pessoas que não passam fome.
deve ser por isso que não se indignam com a pouca vergonha de nossos governantes, pois não reflete diretamente no conforto da vida deles.
vivem de maneira individualista e egoísta. não pensam no próximo.
não se preocupam em manter os valores morais....

o fato de se perdoar um roubo, não o descaracteriza! repito mil vezes!

então, com esse debate, pude chegar à uma conclusão:

as pessoa encontraram subterfúgios para a pouca vergonha própria e alheia.
é muito mais fácil se corromper e seguir a maré do que nadar contra a corrente para manter seus princípios.
e o brasileiro adora uma facilidade. porque brigar se é mais fácil dar as mãos e ser conivente?

eu continuo, com muita dificuldade, nadando contra a maré. ainda que muitas vezes calada para não ser massacrada.

nem que meus princípios não modifiquem nada ao meu redor.....
nada e nem ninguém irá mudá-los.


2 comentários:

Julie Slim disse...

se eu fosse da sua turma, seríamos então 3 a defender a mesma tese! eu tb de vez em quando converso sobre como os valores estão invertidos! só um exemplo: hj em dia as pessoas não se envergonham de dizer que traem seus(uas) companheiros(as), como se isso fosse motivo de orgulho e não de vergonha! como se trair não fosse pra qualquer um e ser fiel é coisa de gente boba que não tem capacidade e coragem (?????) de arrumar outro(a).
Obrigada pela visita, vou linkar os eu blog no meu para acompanhar, ok?

Luisa Dias disse...

Ufa! Roubo é roubo... Pode sim ter perdão e ser compreendido, mas não cabe dentro de uma instituição. Acho que chefes e colegas, além de alertados, se tão solidários a situação poderiam ter colaborado de outra forma que não com a conviência. Boa semana!